REVISTA DOS TRIBUNAIS

Reforma da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992)

Reforma da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992)

reforma da lei de improbidade administrativa

A Lei de Improbidade Administrativa (LIA – Lei 8.429/1992) é um marco no combate à corrupção na Administração Pública, dispondo sobre penalidades e multas a serem aplicadas diante da prática de atos de improbidade administrativa cometidos por agente públicos ou políticos que (i) atentem contra os princípios da Administração Pública, (ii) causem prejuízo ao erário ou (iii) causem enriquecimento ilícito ao agente. É uma das principais ferramentas do Direito Administrativo para proteção do patrimônio público e o fomento da atuação lícita dos servidores e agentes públicos.

Vale ressaltar aqui que agente público é todo aquele que age em nome do Estado, exercendo qualquer tipo de atividade pública, ainda que de forma não remunerada e transitória; e agente político é aquele investido no seu cargo, por meio de eleição, nomeação ou designação.

Recentemente, a Lei 14.230/2021 alterou diversos dispositivos da Lei de Improbidade Administrativa, ficando conhecida como Reforma da Lei de Improbidade. Dentre as alterações, a principal delas é a exigência de dolo por parte do agente para que este seja responsabilizado pelo ato considerado de improbidade, ou seja, a caracterização da improbidade depende da vontade livre e consciente do agente de alcançar o resultado ilícito. Danos causados por imprudência, imperícia ou negligência não figuram mais como atos de improbidade administrativa.
Outras alterações importantes são:

  • Vedação à punição de atos omissivos ou comissivos decorrentes de divergências na interpretação da Lei;
  • Contratação de parentes como tipo de improbidade, não bastando a mera nomeação ou indicação, sendo necessário comprovar a intenção;
  • Escalonamento de sanções: nos casos menos ofensivos à Administração Pública, a pena poderá ser limita à aplicação de multa, ficando a critério do juiz e sem prejuízo de ressarcimento ao erário;
  • Limitação do bloqueio direto das contas bancárias, dando preferência ao bloqueio de bens de menor liquidez, como automóveis e imóveis;
  • Permissão para que penas aplicadas por outras esferas sejam compensadas com as sanções aplicadas nas ações de improbidade administrativa;
  • Autorização de parcelamento, em até 48 vezes, do débito resultante de condenação pela prática de improbidade no caso de o réu comprovar a incapacidade financeira de saldá-lo imediatamente.
A posição do Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tema 1.199

Diante da relevância do tema, muito se questionou acerca da retroatividade ou não na aplicação das mudanças introduzidas pela Lei 14.230/2021, mais especificamente em relação aos atos de improbidade culposos e os novos prazos prescricionais. Assim sendo, o STF, apreciando o Tema 1.199 no ARE 843.989, por unanimidade, fixou a seguinte tese de repercussão geral:

  • A norma benéfica da Lei 14.230/2021 – revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é irretroativa, em virtude do art. 5º, XXXVI, CF, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes;
  • O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é irretroativo, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da Lei;
  • É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei de Improbidade Administrativa, a presença do elemento subjetivo – DOLO;
  • A nova Lei 14.230/2021 somente retroage no caso de atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da Lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior.
Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) 7042, 7043 e 7236

Ainda sobre o tema 1.199, foram propostas as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) 7.042 e 7.043 contra as alterações introduzidas na Lei de Improbidade Administrativa pela Lei 14.230/2021, que atribuíram exclusivamente ao Ministério Público (MP) a legitimidade para propor ação de improbidade administrativa, com a justificativa de que a nova legislação anulou a prerrogativa dos entes públicos prejudicados, impedindo o dever-poder dos entes federativos de defender sua Constituição e conservar seu patrimônio público.

Ambas as ações foram julgadas parcialmente procedentes para declarar a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, da redação dada ao art. 17, §§ 6º-A e 10-C e art. 17B, §§ 5º e 7º, restabelecendo a legitimidade ativa concorrente do MP e pessoas jurídicas interessadas para propositura de ação de improbidade administrativa, tendo em vista que a legitimação do MP para tais ações não impede a atuação de terceiros; bem como também declarou a inconstitucionalidade parcial, com redução de texto, da redação dada ao art. 17, § 20, no sentido de que não há obrigação de defesa judicial pela assessoria jurídica que emitiu o parecer atestando a legalidade prévia dos atos administrativos praticados pelo agente, havendo, porém, a possibilidade da Advocacia Pública autorizar referida defesa.

Já na ADI 7.236, que também foi proposta contestando algumas das alterações na LIA introduzidas pela Lei 14.230/2021, o STF concedeu medida liminar para suspender a eficácia de dispositivos da Lei, quais sejam:

  • art. 1º, § 8º: trata da não responsabilização diante de divergência interpretativa da Lei;
  • art. 12, §§ 1º e 10: versam sobre a perda da função pública e sobre direitos políticos, respectivamente;
  • art. 17-B, § 3º: autonomia do MP;
  • art. 21, § 4º: responsabilização administrativa e penal.

Ademais, a ADI 7.236 também analisou o mérito do art. 23-C da Lei e conferiu interpretação conforme a Constituição Federal, de modo que os atos que causem enriquecimento ilícito, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação de recursos públicos dos partidos políticos, ou de suas fundações, serão responsabilizados nos termos da Lei 9.096/1995 (Lei dos Partidos Políticos).

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