Por Lisandra Paraguassu e Andreas Rinke
RIO DE JANEIRO (Reuters) – Líderes do G20 emitiram nesta segunda-feira uma declaração conjunta destacando o sofrimento causado pelos conflitos em Gaza e na Ucrânia, ao mesmo tempo em que pediram cooperação em relação às mudanças climáticas, redução da pobreza e política tributária.
Os líderes das maiores economias do mundo, reunidos no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro para uma cúpula de dois dias, abordaram uma agenda que reflete uma ordem global em transformação, tentando reforçar o consenso multilateral antes que o presidente eleito dos EUA, Donald Trump, retorne ao poder em janeiro.
Suas discussões sobre comércio, mudança climática e segurança internacional esbarrarão nas fortes mudanças de política dos EUA que Trump promete ao assumir o cargo, desde tarifas até a promessa de uma solução negociada para a guerra na Ucrânia.
Ainda assim, os líderes da cúpula conseguiram chegar a um consenso restrito sobre a escalada da guerra na Ucrânia, concentrando-se sucintamente no “sofrimento humano” e nas consequências econômicas do conflito.
A declaração dos líderes também expressou “profunda preocupação com a situação humanitária catastrófica na Faixa de Gaza” e pediu urgentemente mais ajuda e proteção para os civis, além de um cessar-fogo abrangente em Gaza e no Líbano.
Após um ataque aéreo maciço da Rússia na Ucrânia no domingo, os diplomatas europeus pressionaram para revisar a linguagem previamente acordada sobre conflitos globais, mas acabaram cedendo.
O presidente russo, Vladimir Putin, não compareceu à cúpula, e a Rússia foi representada pelo ministro das Relações Exteriores, Sergey Lavrov.
Foi necessária uma maratona de negociações durante o fim de semana para que os diplomatas finalizassem a declaração conjunta, com o debate sobre a política climática se estendendo até a madrugada de domingo, de acordo com pessoas envolvidas nas negociações.
Em sua declaração, os líderes concordaram que o mundo precisa chegar a um acordo até o final da cúpula da ONU sobre mudança climática COP29, no Azerbaijão, sobre uma nova meta financeira para o volume de dinheiro que as nações ricas devem fornecer às nações em desenvolvimento mais pobres.
As autoridades da COP29 pediram aos líderes do G20 um sinal forte para ajudar a resolver o impasse sobre o financiamento climático. Embora a declaração conjunta tenha afirmado que as nações precisam resolver a questão, não houve uma indicação de qual deveria ser a solução na cúpula da ONU, prevista para terminar na sexta-feira.
Como anfitrião das reuniões do G20 deste ano, o Brasil ampliou o foco do grupo sobre a pobreza extrema e a fome, ao mesmo tempo em que introduziu o debate sobre a cooperação para tributar de forma justa os mais ricos do mundo — tópicos também destacados na declaração conjunta dos líderes.
LULA LUTA CONTRA A FOME
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva abriu a cúpula nesta segunda-feira com o lançamento de uma aliança global para combater a pobreza e a fome, com o apoio de mais de 80 países, além de bancos multilaterais e grandes filantropos.
“A fome e a pobreza não são resultado da escassez ou de fenômenos naturais… são o produto de decisões políticas, que perpetuam a exclusão de grande parte da humanidade”, disse Lula.
“Em um mundo que produz quase 6 bilhões de toneladas de alimentos por ano, isso é inadmissível.”
As autoridades brasileiras reconheceram que o restante de sua agenda para o G20 — incluindo o desenvolvimento sustentável e a taxação dos super-ricos — poderia perder força quando Trump começar a ditar as prioridades globais a partir da Casa Branca.
Ainda assim, os líderes mundiais reconheceram que a agenda do Brasil como presidente do grupo, adotada pela anfitriã África do Sul para 2025, levou o debate para além da zona de conforto tradicional das potências ocidentais.
“Estamos passando por uma grande, grande mudança nas estruturas globais”, disse o chanceler alemão, Olaf Scholz, nos bastidores da cúpula, observando o peso crescente das principais economias em desenvolvimento. “Esses são países que querem ter voz ativa. E eles não aceitarão mais que tudo continue a ser como tem sido há décadas.”
O presidente chinês, Xi Jinping, aproveitou a ocasião para anunciar uma série de medidas destinadas a apoiar as economias em desenvolvimento do “Sul Global”, desde a cooperação científica com o Brasil e as nações africanas até a redução das barreiras comerciais para os países menos desenvolvidos.
Enquanto Xi desempenhou um papel central na cúpula, o presidente dos EUA, Joe Biden, chegou como um líder enfraquecido politicamente, com apenas dois meses restantes na Casa Branca, conforme tenta lidar com os conflitos crescentes na Ucrânia e no Oriente Médio.
À medida que o mundo aguarda os sinais do novo governo de Trump, Xi vem divulgando a ascensão econômica da China, incluindo sua alardeada iniciativa Nova Rota da Seda, que inaugurou um enorme porto de águas profundas no Peru na semana passada.
Até o momento, o Brasil se recusou a participar da iniciativa de infraestrutura global, mas há grandes esperanças de outras parcerias industriais quando Xi encerrar sua estadia no país com uma visita de Estado a Brasília na quarta-feira.
(Reportagem de Lisandra Paraguassu, Andreas Rinke, Eduardo Baptista, Jarret Renshaw, Elizabeth Pineau, Jake Spring no Rio de Janeiro)