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Acordo Mercosul-UE pode pressionar indústria do Brasil, diz sindicato do ABC

Acordo Mercosul-UE pode pressionar indústria do Brasil, diz sindicato do ABC

Imagem aérea de um estacionamento amplo lotado com diversos carros em fila, mostrando a organização e a variedade de veículos estacionados nas vagas.

SÃO PAULO (Reuters) – O histórico acordo comercial entre o Mercosul e União Europeia gerou preocupações no maior sindicato de metalúrgicos do país, que teme um aumento de importações de produtos industrializados europeus em meio a um quadro em que a indústria cobra há anos medidas de melhora de competitividade.

O acordo, que teve os termos divulgados na terça-feira, prevê mecanismos de proteção para alguns setores da indústria nacional em caso de ocorrência de dano ao Brasil. No entanto, dado o peso do agronegócio nas negociações, existe o receio de dificuldades para a implementação de medidas que freiem um eventual salto nas importações do setor industrial europeu, disse o diretor administrativo do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Wellington Damasceno, nesta quarta-feira.

“Como está construído (o acordo) beneficia muito mais o agronegócio”, disse o diretor do sindicato do ABC, que afirma representar 72 mil trabalhadores na região metropolitana de São Paulo.

“A balança comercial pode continuar favorável para o Brasil, mas em termos de desenvolvimento tecnológico, de se ter mão de obra mais qualificada, de agregar valor, pode ser um grande prejuízo no longo prazo”, afirmou o sindicalista.

Os termos do acordo foram assinados alguns meses depois que o governo federal tomou as primeiras medidas de proteção comercial de alguns setores industriais do país de olho principalmente em um salto nas importações brasileiras de produtos da China.

Mas com o acordo de liberação de tarifas entre UE-Mercosul, que ainda deve levar meses, ou anos, para ser implementado, Damasceno vê novo risco para o setor industrial brasileiro.

“Temos grande preocupação desses setores — automotivo, químico, de máquinas, fármacos, entre outros — ficarem muito vulneráveis, ainda mais porque grande parte das matrizes das empresas que atuam no Brasil estão na Europa.”

Desde semana passada, quando os blocos comerciais anunciaram o acordo, o setor industrial brasileiro tem se mostrado comedido nos comentários a respeito do pacto.

A associação de montadoras, Anfavea, por exemplo, citou que a Europa “é um parceiro histórico do Brasil” e que o acordo “parece” estimular um “ambiente de maior competitividade para a indústria nacional, beneficiando todas as partes envolvidas”.

Já a entidade que reúne fabricantes de autopeças, Sindipeças, afirmou que precisa analisar detalhadamente os termos do acordo, citando que ele “é mais um dos caminhos possíveis para aumentar a inserção de nossa indústria nas cadeias globais de valor”.

Enquanto isso, a Fiesp, afirmou no dia do anúncio do acerto com a UE que “confia que o acordo será um espaço de diálogo para a promoção do comércio em bases justas, como forma de superar eventuais medidas que restrinjam o fluxo de bens e serviços entre os blocos econômicos”.

AUTOMOTIVO

Na avaliação do diretor do sindicato do ABC, os mecanismos de proteção do setor automotivo brasileiro previstos no acordo não são suficientes.

Segundo os termos do acordo do Mercosul com UE, o Brasil poderá suspender por três anos o cronograma de liberalização de tarifas de todo o setor automotivo ou retomar a alíquota de 35% em vigor atualmente, sem necessidade de oferecer compensação à União Europeia. A suspensão poderá ser renovada por dois anos.

“Não é suficiente… por mais que se tenha alguns anos, carro não se faz da noite para o dia e os próximos ciclos, principalmente para eletrificação, podem considerar plataforma europeia para exportação para o mercado brasileiro”, disse Damasceno, citando que atualmente a indústria automotiva do Brasil já está importando número crescente de componentes eletrônicos para equipar seus veículos.

O acordo entre os dois blocos ocorreu em um momento em que a maior montadora de veículos da Europa, a Volkswagen, trava uma disputa com trabalhadores para fechar fábricas e demitir pessoal na Alemanha diante de um quadro de excesso de capacidade produtiva, fraqueza de demanda e concorrência com montadoras da China.

Damasceno é representante do sindicato no comitê mundial de trabalhadores da Volkswagen e voltou nesta semana ao Brasil de encontro com metalúrgicos da montadora na Alemanha.

Segundo ele, há possibilidade de que atualizações de veículos fabricados no Brasil pela Volkswagen sejam feitas apenas na Europa, com a montadora optando por apenas importá-las ao país. O mesmo pode ocorrer com novos modelos.

“Eles (VW na Alemanha) têm uma capacidade ociosa de 500 mil veículos (por ano). Isso é a produção da Volkswagen no Brasil e na Argentina no ano. Temos carros produzidos aqui que também são produzidos lá e o acordo abre possibilidade desses carros chegarem aqui sem pagar imposto de importação”, disse o diretor do sindicato dos metalúrgicos do ABC, citando os veículos Nivus, Polo e T-Cross.

A Volkswagen assinou no ano passado acordo de estabilidade de emprego com sindicatos de metalúrgicos do Brasil até 2028. Para Damasceno, o acordo com os trabalhadores é um dos fatores que permitiu o anuncio de investimentos de 16 bilhões de reais pela montadora no país até 2028.

Atualmente, a Volkswagen tem quatro fábricas no Brasil, empregando 15 mil funcionários, dos quais 8,2 mil em São Bernardo do Campo (SP), sede do sindicato, disse Damasceno.

Segundo o diretor, atualmente a operação brasileira goza de boa autonomia em relação à matriz da Volkswagen, apresentando “bons resultados” e o acordo acertado no ano passado está sendo usado de “modelo” nas discussões dos trabalhadores da companhia na Alemanha.

 

(Por Alberto Alerigi Jr.)

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