Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) – O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta quarta-feira para absolver o ex-presidente Jair Bolsonaro de todos os crimes de que foi acusado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) no julgamento por tentativa de golpe de Estado e outros crimes.
Em um voto iniciado pela manhã e que se estendeu durante o dia inteiro, Fux marcou uma frontal divergência com o voto do relator do processo, Alexandre de Moraes, e também com o voto do ministro Flávio Dino, que acompanhou o relator. Moraes e Dino votaram pela condenação de Bolsonaro e demais sete réus pelos crimes de tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
No exaustivo voto com mais de nove horas de duração, Fux fez questão de analisar uma a uma as condutas apontadas pela PGR sobre a suposta ação criminosa de Bolsonaro, rebatendo todas elas seja por falta de provas ou por considerar que a atuação não se enquadrava em um tipo penal.
O magistrado afirmou que não havia prova do envolvimento do ex-presidente em planos de minutas golpistas ou também de ações para tentar assassinar Moraes, o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva e o vice dele Geraldo Alckmin, conforme apontado pela acusação.
Para Fux, “bravatas” e “inconformismo” não podem levar os réus no processo a serem punidos por abolição do Estado de Direito.
“A interpretação adequada do dispositivo exige que se preserve o princípio da lesividade de modo a restringir a incidência do tipo penal ao comportamento que apresente perigo real à estabilidade dos Poderes constituídos”, destacou ele, para considerar que se não agir assim se estará ampliando “indevidamente” o tipo penal.
“Não configuram crimes eventuais acampamentos, manifestações, faixas e aglomerações que consistem em manifestações políticas com propósitos sociais”, disse ele, ao acrescentar que isso vale mesmo quando ocorre a “irresignação pacífica contra poderes públicos”.
Fux começou seu voto alegando que o STF não é a corte competente para julgar os envolvidos no caso, uma vez que os réus não possuem foro por prerrogativa de função. Ele defendeu ainda que, uma vez que o caso está no STF, Bolsonaro então deveria ser julgado pelo plenário do Supremo, e não por uma turma, já que seus crimes teriam sido cometidos ainda no exercício da função.
Fux também divergiu de Moraes e Dino ao entender que houve cerceamento de defesa aos advogados dos réus dada a grande quantidade de material apreendido nas investigações e o que considerou um tempo curto para análise.
Apesar do voto de Fux, há ampla expectativa de que a Primeira Turma, composta por cinco membros, condene Bolsonaro em todos os crimes imputados pela PGR. Depois de Fux, irão votar a ministra Cármen Lúcia e o presidente da Turma, Cristiano Zanin, ambos indicados ao STF pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
No entanto, o voto do ministro pode reforçar o argumento da defesa de Bolsonaro de que o caso deveria ser decidido pelo plenário do STF, composto por 11 ministros, incluindo dois indicados pelo ex-presidente.
Se condenado, Bolsonaro poderá pegar até 43 anos de prisão, se considerados agravantes para os crimes.
O ex-presidente, que está em prisão domiciliar, nega todas as acusações. Ele afirma que, embora tenha tido conversas sobre a possível decretação de Estado de Sítio, jamais deu qualquer ordem nesse sentido. Alega também que estava nos Estados Unidos quando aconteceram os ataques às sedes dos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023.
Bolsonaro também está inelegível por duas decisões do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ainda assim, ele insiste que será candidato à Presidência na eleição do ano que vem, quando Lula deve buscar um quarto mandato no Palácio do Planalto.
CID CONDENADO
Já em relação ao réu Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro que firmou acordo de delação premiada, Fux acompanhou Moraes e Dino ao condená-lo pelo crime de tentativa de abolição violenta do Estado de Direito. Com isso, já há maioria para ele ser considerado culpado desse crime.
Fux também acompanhou Moraes e Dino ao entender que a delação de Cid pode ser usada como meio de prova no processo. Com isso, a Primeira Turma também formou maioria a favor da validade da delação.
Fux disse que as manifestações feitas por Cid na delação foram sempre acompanhadas dos seus advogados e eventuais advertências pontuais do relator que poderiam levá-lo à prisão fazem parte do “rol de perguntas” que Moraes poderia fazer ao delator.
(Reportagem adicional de Lisandra Paraguassu)