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Trabalho e Escravidão Moderna

Trabalho e Escravidão Moderna

Escravidão, segundo o dicionário, é “estado ou condição de escravo; escravatura, escravaria, cativeiro, servidão” ou, ainda, “regime social de sujeição do homem e utilização de sua força, explorada para fins econômicos, como propriedade privada; escravatura”. 

O Brasil, notoriamente, tem um passado marcado pela escravidão, assim como argumenta Erica do Amaral Matos na obra Cárcere e Trabalho, “o trabalho cativo era a forma principal de exploração do trabalho, uma vez que, ainda existindo formas outras de subsistência, embora marginalmente, não era compensatório atrair trabalhadores com vantagens materiais”.

E, embora tenha sido oficialmente abolida em grande parte do mundo, a escravização de pessoas ainda é recorrente em muitas regiões brasileiras e em diversos outros países, mesmo com leis que a tratam como conduta criminosa e passível de prisão.

Como por exemplo a própria legislação penal brasileira, a qual dispõe, em seu artigo 149, que é crime “reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto”. O termo “análogo à escravidão” decorre justamente pelo fato de a escravidão formal ter sido abolida pela Lei Áurea em 1888, tornando, desde então, a prática ilegal.

Vale ressaltar que no Brasil, desde 2003, existe a Lista Suja do Trabalho Escravo, que inclui o nome de todas as empresas autuadas por explorar trabalho análogo ao escravo e impede que essas empresas recebam empréstimos e financiamentos públicos. Os nomes podem constar na lista por até dois anos, com possibilidade de se firmar acordo com o Governo, passando o nome para uma “lista de observação” e, caso cumpra com todos os termos do acordo, seu nome poderá ser retirado após um ano. Atualmente a lista é composta por 290 nomes de empregadores que exploram esse tipo de trabalho (Lista divulgada pelo MTE em 05.04.2023).

Ocorre que muitos empresários recorrem à Justiça para anular as autuações e evitar a inclusão na Lista Suja. Além disso, o Governo Federal tem reduzido o orçamento destinado às ações de fiscalização do trabalho análogo ao escravo, o que compromete a efetividade das medidas de combate à prática.

A escravidão moderna, também conhecida como escravidão contemporânea, é uma forma de exploração humana que persiste nos dias de hoje, na qual uma pessoa ainda é forçada a trabalhar contra sua vontade, muitas vezes em condições desumanas, sem remuneração adequada ou sem remuneração alguma, com restrições de liberdade, e pode assumir diversas formas, incluindo o trabalho forçado, a servidão por dívida, o casamento imposto, a exploração sexual e a exploração infantil. 

Ela é frequentemente associada a setores como a agricultura, mineração, construção, têxteis e pesca, mas também pode ocorrer em setores menos óbvios, como serviços domésticos, trabalho em fábricas clandestinas, produção de carvão vegetal e até mesmo na produção de eletrônicos. As vítimas, em sua maioria mulheres e crianças, que são mais vulneráveis à exploração, podem ser recrutadas com falsas promessas de emprego, enganadas sobre as condições de trabalho e forçadas a trabalhar longas horas.

Apesar dos esforços para combater esse tipo de prática, a falta de fiscalização adequada e a impunidade dos responsáveis ​​ainda são grandes desafios. O sistema legal muitas vezes é ineficaz para proteger as vítimas e punir os culpados, o que contribui para a perpetuação da prática.

Sociologicamente falando, a escravidão moderna destaca as causas e as dinâmicas sociais que surgiram para a sua manutenção. Estas incluem: a pobreza extrema, a falta de acesso à educação, a tendência racial e de gênero, a corrupção e a falta de proteção legal e regulamentar para os trabalhadores. Também está relacionada à globalização e à cadeia de suprimentos, onde muitas empresas terceirizam a produção para países onde a mão de obra é mais barata e os direitos trabalhistas são menos protetivos.

Já em uma perspectiva criminal, a escravidão moderna burla leis e normas internacionais que proíbem a prática como já mencionado inicialmente. No entanto, a aplicação e fiscalização dessas leis pode ser falha, e os trabalhadores escravizados são frequentemente invisibilizados, o que torna ainda mais difícil para as autoridades encontrar e resgatar esses trabalhadores.

Diante desse cenário, é essencial que governos, empresas e sociedade civil trabalhem juntos para erradicar a escravidão moderna, tal como aumentando a fiscalização e intensificando a aplicação das leis.

Além disso, é importante que haja uma conscientização maior sobre o tema, tanto por parte dos consumidores quanto das empresas, para que sejam adotadas medidas eficazes de combate à essa prática desumana e degradante na cadeia de produção. Os consumidores podem, por exemplo, optar por produtos de empresas que se comprometem com práticas éticas e transparentes em relação ao trabalho; enquanto as empresas podem implementar políticas e práticas que garantam o respeito aos direitos trabalhistas e a erradicação do trabalho escravo em suas cadeias de fornecimento.

A luta contra a escravidão moderna é uma questão de direitos humanos e justiça social e exige uma abordagem multifacetada, que envolve conscientização, mobilização social e ação legal. É uma responsabilidade coletiva que exige ação imediata e contínua, sendo necessário que todos se unam para garantir que essa prática seja erradicada de vez, e que todas as pessoas possam viver e trabalhar com dignidade, liberdade e respeito.

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