thomson reuters

BLOG | REVISTA DOS TRIBUNAIS

Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors

A Independência do Brasil e as Primeiras Leis: O que mudou no Direito?

Imagem de uma balança de justiça ao lado de um livro e um martelo de juiz, com a bandeira do Brasil ao fundo, simbolizando o sistema jurídico brasileiro e o poder da justiça no país. Representando a independência do Brasil

Proclamada em 1822, a Independência do Brasil representou muito mais do que uma mera separação política de Portugal. Foi um marco profundo que iniciou transformações significativas em várias áreas da sociedade brasileira, especialmente no campo do Direito.

Com a Independência, teve início, em território nacional, a trajetória constitucional própria: foi outorgada a Constituição de 1824, que, embora possuísse um forte viés patrimonialista, buscou estabelecer instituições e salvaguardar alguns direitos fundamentais, dando os primeiros contornos ao Estado brasileiro.

A Independência, portanto, culminou em uma série de mudanças jurídicas que moldaram e ainda moldam as normas e a história do país.

Como era o Direito no Brasil antes da Independência?

Durante o período colonial, o Brasil seguia o ordenamento jurídico português. As Ordenações Filipinas, promulgadas em 1603, eram o principal conjunto normativo vigente no Brasil nesse período, regulamentando aspectos da vida social, jurídica e administrativa.

Sendo um conjunto de leis portuguesas, essas ordenações não previam as diferenças culturais, sociais e econômicas entre o Brasil e sua metrópole, além de restringirem a autonomia da colônia.

Em seu conteúdo, as Ordenações revelavam-se amplamente exclusivistas, autoritárias e discriminatórias. Havia tratamento diferenciado para os fidalgos (nobres) e para os peões (pessoas comuns), inclusive na matéria penal. Punições mais severas eram destinadas àqueles em piores condições econômicas. A escravidão também era prevista e regulamentada por essas ordenações.

Quais foram as primeiras mudanças jurídicas após a Independência do Brasil?

Com a Independência, surgiu a necessidade de criar normas próprias, adaptadas à realidade nacional. Nesse contexto, foi elaborada a Constituição de 1824, a primeira do Brasil, que estabeleceu os fundamentos do Estado brasileiro e organizou os poderes.

A Constituição da Mandioca, como ficou conhecida, tinha forte viés patrimonialista, instituindo o voto censitário e sendo outorgada — fatores que revelam seu caráter autoritário —, embora tenha garantido a divisão dos poderes e alguns direitos fundamentais.

Vale destacar que a Constituição de 1824 estabeleceu o Poder Moderador, um mecanismo que conferia ao imperador atribuições superiores às dos demais poderes, refletindo a influência das monarquias absolutistas europeias.

Outro marco importante foi o Código Criminal de 1830, que representou um avanço em relação ao antigo sistema penal português. O novo código buscava maior racionalidade e proporcionalidade nas penas, além de incorporar valores mais condizentes com a sociedade brasileira do século XIX.

Também merece destaque o Código Comercial de 1850, fundamental para regular as atividades econômicas e comerciais, especialmente diante do crescimento das cidades e do surgimento de novas relações empresariais. Esses códigos não só padronizaram normas, mas também contribuíram para o desenvolvimento do país, trazendo mais segurança jurídica e estimulando o comércio e os negócios.

Quais desafios marcaram essa transição jurídica?

Apesar desses avanços, a transição ocorreu de forma gradual. Muitas leis brasileiras traziam forte influência do Direito europeu, especialmente do português. Havia grande dificuldade em adaptar essas normas à realidade local.

As elites resistiram às mudanças legislativas nacionais, pois buscavam manter privilégios garantidos pelas legislações tradicionais. O processo de consolidação do Direito brasileiro foi gradual, exigindo revisões constantes das leis e intensos debates sobre o caminho a seguir.

Outro ponto importante é que, nesse período inicial, muitos temas sociais relevantes, como a escravidão, não foram enfrentados de forma imediata pelas novas normas. O Brasil demorou décadas para avançar em direitos civis e sociais, e as primeiras leis pós-Independência refletiam, em parte, esse contexto de mudanças lentas e negociações políticas.

Como se construiu uma identidade jurídica brasileira?

As primeiras leis pós-Independência abriram espaço para debates sobre cidadania, direitos individuais, propriedade, trabalho e relações sociais, mesmo que essas discussões fossem restringidas por pressões autoritárias e pelas elites locais.

Com o passar do tempo, o país passou a discutir temas relevantes, como o fim da escravidão, a regulamentação do trabalho livre e a organização do sistema judiciário. Embora muitos desses avanços tenham ocorrido de forma lenta e tímida, foram essenciais para o amadurecimento do sistema jurídico brasileiro, que culminou na Constituição Federal de 1988.

A partir dessas primeiras iniciativas, o Brasil começou a formar uma tradição jurídica própria, incorporando elementos estrangeiros, mas também adaptando normas às necessidades do povo brasileiro.

Quais reflexos da Independência ainda permanecem no Direito?

A Independência do Brasil foi, sem dúvida, um divisor de águas para o Direito nacional. Ainda que as mudanças não tenham sido imediatas ou completas, a busca por normas próprias e a construção de um ordenamento jurídico adaptado à nossa realidade foram fundamentais para consolidar a soberania do país.

Hoje, ao olharmos para trás, percebemos que esse processo foi cheio de desafios, mas indispensável para que pudéssemos evoluir e discutir questões cada vez mais complexas e atuais.

Assim, entender o impacto da Independência nas primeiras leis brasileiras é essencial para compreender a trajetória do nosso Direito e valorizar os esforços daqueles que contribuíram para construir um sistema jurídico mais justo e alinhado com os interesses nacionais.

📚 Estude mais sobre o tema adquirindo o livro: Processo Constitucional e Democracia, 3ª ed., de Luiz Guilherme Marinoni.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Mais lidas

Post Relacionado

Homem pensativo com braços cruzados usando relógio de pulso preto, vestido com camiseta preta, de cabelo curto e barba rala, em ambiente urbano.

STF condena Bolsonaro e mais 7 réus por tentativa de golpe de Estado

Por Ricardo Brito BRASÍLIA (Reuters) – A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) condenou nesta quinta-feira o ex-presidente Jair Bolsonaro por cinco crimes relacionados a uma tentativa de golpe de Estado após sua derrota na eleição de 2022, impondo um duro golpe ao líder de direita, que já está

Imagem de Donald Trump ao ar livre, vestindo terno escuro, camisa branca e gravata vermelha, fazendo sinal de despedida ou cumprimento com a mão. Fundo com árvores e céu claro.

Trump diz estar insatisfeito com condenação de Bolsonaro em julgamento no STF

WASHINGTON (Reuters) – O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, disse estar surpreso e insatisfeito com o fato de o ex-presidente Jair Bolsonaro ter sido condenado por uma maioria de ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quinta-feira por planejar um golpe de Estado para permanecer no

Homem de terno e gravata olhando para o céu, vestido formalmente e em ambiente ao ar livre.

Rubio promete resposta dos EUA após condenação de Bolsonaro pelo STF

WASHINGTON (Reuters) – O secretário de Estado dos Estados Unidos, Marco Rubio, disse nesta quinta-feira que o país “responderá adequadamente a essa caça às bruxas” depois que o ex-presidente Jair Bolsonaro foi condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por planejar um golpe de Estado para permanecer no poder. “As perseguições

REVISTA DOS TRIBUNAIS
Privacy Overview

This website uses cookies so that we can provide you with the best user experience possible. Cookie information is stored in your browser and performs functions such as recognising you when you return to our website and helping our team to understand which sections of the website you find most interesting and useful.