Por Richard Cowan e David Morgan e Nolan D. McCaskill e Andy Sullivan
WASHINGTON (Reuters) – O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, advertiu os democratas do Congresso nesta terça-feira que permitir a paralisação do governo federal à meia-noite daria a sua administração a oportunidade de tomar medidas “irreversíveis”, incluindo o encerramento de programas importantes para eles.
“Podemos fazer coisas durante a paralisação que são irreversíveis, que são ruins para eles e irreversíveis para eles, como cortar um grande número de pessoas, cortar coisas de que eles gostam, cortar programas de que eles gostam”, disse Trump em comentários aos repórteres no Salão Oval da Casa Branca.
“Todos vocês conhecem Russell Vought”, acrescentou Trump, referindo-se ao diretor do Escritório de Gestão e Orçamento. “Ele se tornou muito popular recentemente porque pode reduzir o orçamento a um nível que não poderia ser feito de outra forma.” Trump não especificou as medidas que poderia tomar, mas recentemente levantou a possibilidade de reduzir ainda mais a força de trabalho federal.
À meia-noite, os Estados Unidos entrarão em sua 15ª paralisação do governo desde 1981, a menos que os republicanos e democratas no Congresso cheguem a um acordo para financiar temporariamente as agências federais com o início de um novo ano fiscal na quarta-feira.
A ameaça de Trump de atacar os programas favorecidos pelos democratas no caso de uma paralisação do governo soou como um alarme no momento em que os parlamentares se preparavam para uma tentativa de última hora de estender o financiamento para além da meia-noite.
Uma proposta democrata que estenderia os benefícios de saúde para milhões de norte-americanos fracassou por 47 a 53 no Senado.
Em seguida, foi apresentado um projeto de lei apoiado pelos republicanos que estenderia o financiamento do governo sem a correção do sistema de saúde, que também deveria fracassar.
Os confrontos relacionados ao orçamento se tornaram uma característica rotineira em Washington, uma vez que a política do país tem se tornado cada vez mais disfuncional, embora muitas vezes sejam resolvidos no último minuto. O governo foi paralisado pela última vez por 35 dias em 2018 e 2019, durante o primeiro mandato de Trump, devido a uma disputa sobre imigração.
DISPUTA DE TRILHÕES DE DÓLARES
O que está em questão agora é US$1,7 trilhão que financia as operações das agências, o que equivale a cerca de um quarto do orçamento total de US$7 trilhões do governo. A maior parte do restante vai para programas de saúde e aposentadoria e pagamentos de juros sobre a crescente dívida de US$37,5 trilhões.
Enquanto isso, as agências federais começaram a emitir planos detalhados de que fechariam escritórios que realizam pesquisas científicas, atendimento ao público e outras atividades não consideradas essenciais e mandariam milhares de trabalhadores para casa se o Congresso não chegar a um acordo sobre uma solução antes que o financiamento expire.
Especialistas em orçamento alertaram que alguns norte-americanos já poderiam estar sentindo as consequências.
Com a possível interrupção dos reembolsos do Medicare para “cuidados hospitalares agudos” em casa, os pacientes estavam precisando encontrar instalações para internação, disse Jonathan Burks, especialista em saúde do Centro de Política Bipartidária. “Isso é um verdadeiro transtorno neste momento”, disse ele aos repórteres nesta terça-feira.
Ele acrescentou que os reembolsos do Medicare para visitas médicas de telessaúde também expirariam à meia-noite.
As companhias aéreas advertiram que uma paralisação poderia atrasar os voos, enquanto o Departamento do Trabalho disse que não emitiria seu relatório mensal de desemprego, um barômetro da saúde econômica observado de perto. A Administração de Pequenas Empresas informou que deixaria de conceder empréstimos, enquanto a Agência de Proteção Ambiental disse que suspenderia alguns esforços de limpeza de poluição.
Quanto mais tempo durar a paralisação, mais amplo será o impacto.
Os subsídios públicos para moradia de famílias de baixa renda poderiam diminuir e alguns operadores dos programas de educação infantil Head Start para crianças de famílias de baixa renda poderiam sofrer atrasos no recebimento de verbas, de acordo com especialistas do Centro de Política Bipartidária.
GOVERNO AMEAÇA MAIS DEMISSÕES
A disposição de Trump de ignorar as leis de gastos aprovadas pelo Congresso injetou mais incerteza desta vez, e ele ameaçou estender seu expurgo da força de trabalho federal se o Congresso permitir paralisação do governo.
Na primavera (no hemisfério norte), ele ordenou que as agências federais considerassem a possibilidade de demitir funcionários “não essenciais” que normalmente seriam obrigados a não trabalhar durante uma paralisação.
A ameaça de Trump de demitir mais funcionários federais ou eliminar totalmente alguns programas pode aprofundar o caos. Desde que retornou ao cargo em janeiro, ele se recusou a gastar bilhões de dólares autorizados pelo Congresso e reduziu a folha de pagamento federal em cerca de 300.000 pessoas.
“Ele quer tomar medidas adicionais para punir o povo deste país se houver uma paralisação”, disse o senador democrata Chris Van Hollen, de Maryland.
As ações de Trump levaram alguns democratas a questionar por que deveriam votar em qualquer legislação de gastos.
Embora os republicanos controlem as duas Casas do Congresso, eles precisam de pelo menos sete votos democratas para aprovar a legislação no Senado.
Os democratas estão sob pressão de seus apoiadores frustrados para obter uma rara vitória antes das eleições de meio de mandato de 2026, que determinarão o controle do Congresso nos dois últimos anos do mandato de Trump.
Os democratas insistem que qualquer projeto de lei de gastos também deve tornar permanentes os subsídios do Affordable Care Act que devem expirar no final do ano. Sem uma correção, os custos de saúde para 24 milhões de norte-americanos aumentarão drasticamente, com um impacto desproporcional em Estados controlados pelos republicanos, como a Flórida e o Texas, que se recusaram a promulgar outros aspectos da lei que fornecem cobertura para pessoas de baixa renda.
Os democratas também tentaram garantir que Trump não poderá desfazer essas mudanças se elas forem sancionadas como lei.
Os republicanos dizem que estão abertos a uma solução, mas acusam os democratas de manter o orçamento refém de suas exigências.
Os democratas disseram que acreditavam estar avançando com Trump após uma reunião na Casa Branca na segunda-feira. Mas, horas depois, o presidente publicou um vídeo deepfake mostrando imagens manipuladas de líderes democratas que se baseavam em imagens estereotipadas de mexicanos.
“Da próxima vez que você tiver algo a dizer sobre mim, não se esconda por meio de um vídeo racista e fake de IA. Quando eu estiver de volta ao Salão Oval, diga isso na minha cara”, disse o líder democrata da Câmara, Hakeem Jeffries, aos repórteres.