Foi publicada, com vetos, na Edição Extra B do DOU de 16.1.2025, a Lei Complementar 214/2025, que regulamenta a Reforma Tributária instituída pela EC 132/2023.
Importante destacar que o referido ato é o primeiro a ser publicado depois da EC, logo, é esperado que novos projetos sejam aprovados para regulamentar, de forma individualizada, cada um dos novos tributos.
Como já divulgado, a EC 132/2023 reformulou nosso sistema tributário em relação aos tributos incidentes sobre o consumo, prevendo, assim, a extinção do PIS, da COFINS, do ICMS e do ISS.
Novidades da Reforma Tributária
Em relação ao IPI, suas alíquotas serão zeradas apenas para os produtos que não tenham industrialização incentivada na ZFM, criando assim, o chamado “IPI Zona Franca de Manaus”.
Os referidos tributos serão substituídos pelos seguintes:
- a) Imposto sobre Bens e Serviços (IBS): substitui o ICMS e o ISS. Será de competência dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e incidirá sobre operações com bens materiais ou imateriais, inclusive direitos, ou com serviços;
- b) Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS): substitui o PIS e a COFINS. Será de competência da União e incidirá sobre bens e serviços, nos termos fixados em lei complementar; e
- c) Imposto Seletivo (IS): Será de competência federal, com arrecadação dividida com os demais entes federados, destinado a desestimular o consumo de bens e serviços considerados prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.
Assim, a presente Lei Complementar regulamenta diversos aspectos da Reforma Tributária, dentre os quais destacamos:
I – IBS e CBS
Foram regulamentados, dentre outros tópicos:
- a) as hipóteses de incidência – os referidos tributos incidirão sobre operações onerosas com bens ou com serviços, assim entendidas como aquelas que envolvem qualquer fornecimento com contraprestação, incluindo o decorrente de: compra e venda, troca ou permuta, dação em pagamento e demais espécies de alienação; locação; licenciamento, concessão, cessão; mútuo oneroso; doação com contraprestação em benefício do doador, entre outras;
- b) os casos de não incidência, tais como: transferência de bens entre estabelecimentos pertencentes ao mesmo contribuinte; baixa, liquidação e transmissão, incluindo alienação, de participação societária; transmissão de bens em decorrência de fusão, cisão e incorporação e de integralização e devolução de capital; rendimentos financeiros, exceto quando incluídos na base de cálculo no regime específico de serviços financeiros, entre outros;
- c) as imunidades aplicadas, tais como nas operações de exportação e nas realizadas por entidades religiosas e templos de qualquer culto, inclusive suas organizações assistenciais e beneficentes, bem como no fornecimento de livros, jornais, periódicos e do papel destinado à sua impressão, entre outros;
- d) o momento de ocorrência do fato gerador, assim entendido como o momento do fornecimento nas operações com bens ou com serviços, ainda que de execução continuada ou fracionada;
- e) a base de cálculo, que compreenderá o valor integral cobrado pelo fornecedor a qualquer título. Também foi definido o que integra e o que não integra a referida base;
- f) as modalidades de extinção do débito e suas regras, quais sejam: compensação com créditos, respectivamente, de IBS e de CBS apropriados pelo contribuinte, pagamento pelo contribuinte, recolhimento na liquidação financeira da operação (split payment), recolhimento pelo adquirente e pagamento pelo responsável; e
- g) as regras aplicáveis na importação de bens e serviços, tais como: fato gerador, base de cálculo, pagamento, regimes aduaneiros especiais, entre outros.
Destacamos também que o IBS e a CBS serão não cumulativos, com período de apuração mensal e as operações realizadas serão consolidadas por todos os estabelecimentos do contribuinte.
Em relação às alíquotas foram estabelecidas as regras para sua aplicação, mas sem indicação dos percentuais, os quais serão disciplinados em Lei específica.
II – Não cumulatividade
Um dos pontos que mais tem gerado dúvidas em relação aos novos tributos está vinculado a como vai funcionar, na prática, a não cumulatividade. De acordo com o texto legal, temos o seguinte:
A apropriação de créditos do IBS e da CBS será feita quando ocorrer a extinção por qualquer das modalidades de extinção dos débitos relativos às operações em que o contribuinte – sujeito ao regime regular – seja adquirente, excetuadas exclusivamente aquelas consideradas de uso ou consumo pessoal.
Destacamos que os créditos não são calculados sobre o valor de aquisição do bem ou serviço, como temos hoje para o PIS e COFINS, mas sim sobre os valores dos débitos do IBS e da CBS que tenham sido destacados no documento fiscal de aquisição.
Os créditos poderão ser apurados, inclusive, nas aquisições de bem ou serviço fornecido por optante pelo Simples Nacional.
No que tange às operações consideradas de uso ou consumo pessoal, o ato trouxe a lista dos bens e serviços que se enquadram nesse conceito.
Um ponto de destaque é que alguns benefícios concedidos aos empregados passaram a gerar créditos, tais como: serviços de planos de assistência à saúde e de fornecimento de vale-transporte, de vale-refeição e vale-alimentação destinados a empregados e seus dependentes em decorrência de acordo ou convenção coletiva de trabalho.
III – Cashback
É prevista a devolução personalizada dos tributos (IBS e CBS) para famílias de baixa renda (cashback), que será calculada mediante aplicação de percentual mínimo (piso) sobre o valor do tributo. Assim vejamos:
- a) 100% para a CBS e 20% para o IBS na aquisição de botijão de até 13 kg de gás liquefeito de petróleo, nas operações de fornecimento domiciliar de energia elétrica, abastecimento de água, esgotamento sanitário e gás canalizado e nas operações de fornecimento de telecomunicações; e
- b) 20% para a CBS e para o IBS, nos demais casos.
IV – Alíquota zero
O ato trouxe a lista dos produtos enquadrados na Cesta Básica Nacional, os quais contarão com alíquota zero do IBS e da CBS.
Também haverá alíquota zero para dispositivos médicos; dispositivos de acessibilidade próprios para pessoas com deficiência; medicamentos listados; produtos de cuidados básicos à saúde menstrual; produtos hortícolas, frutas e ovos; automóveis de passageiros adquiridos por pessoas com deficiência ou com transtorno do espectro autista; automóveis de passageiros adquiridos por motoristas profissionais que destinem o automóvel à utilização na categoria de aluguel (táxi); e serviços prestados por Instituição Científica, Tecnológica e de Inovação (ICT) sem fins lucrativos.
As listas com as operações beneficiadas encontram-se nos anexos da presente Lei Complementar.
V – Regimes Diferenciados
Os regimes diferenciados consistem na possibilidade de aplicação de alíquotas reduzidas ou de concessão de créditos presumidos do IBS e da CBS, dentre os quais destacamos:
- a) redução de 30% das alíquotas na prestação de serviços profissionais, cuja atividade seja considerada intelectual de natureza científica, literária ou artística, submetidas à fiscalização por conselho profissional. O ato trouxe a lista de quais atividades se enquadram nessa hipótese;
- b) redução de 60% das alíquotas para as operações com: serviços de educação; serviços de saúde; dispositivos médicos; dispositivos de acessibilidade próprios para pessoas com deficiência; medicamentos (aos não incluídos na lista com o benefício da alíquota zero); alimentos destinados ao consumo humano; produtos de higiene pessoal e limpeza majoritariamente consumidos por famílias de baixa renda; produtos agropecuários, aquícolas, pesqueiros, florestais e extrativistas vegetais in natura; insumos agropecuários e aquícolas; produções nacionais artísticas, culturais, de eventos, jornalísticas e audiovisuais; comunicação institucional; atividades desportivas; e bens e serviços relacionados à soberania e à segurança nacional, à segurança da informação e à segurança cibernética; e
- c) as operações passíveis de apuração de créditos presumidos.
VI – Regras de transição
Foram estabelecidas as regras de transição para o IBS e a CBS, que iniciará em 2026 até 2032.
De forma resumida, temos:
- a) IBS – de 1º.1.2026 a 31.12.2026 será cobrado mediante aplicação da alíquota estadual de 0,1%. Durante esse período a arrecadação não observará as vinculações, repartições e destinações previstas na Constituição Federal;
De 1º.1.2027 a 31.12.2028 será cobrado à alíquota estadual de 0,05% e à alíquota municipal de 0,05%.
A partir de 2029 até 2032 haverá aumento gradual das alíquotas do IBS e redução gradual das alíquotas do ICMS e ISS, de modo que a arrecadação com o novo imposto (calculada com base nas receitas de referência de Estados e Municípios) atinja os seguintes percentuais:
10%, em 2029;
20%, em 2030;
30%, em 2031; e
40%, em 2032.
- b) CBS – de 1º.1.2026 a 31.12.2026 será cobrada mediante aplicação da alíquota de 0,9%;
A partir de 2027, o PIS e a COFINS serão, de fato, extintos e a CBS observará o seguinte:
De 1º.1.2027 a 31.12.2028, a alíquota será aquela fixada na legislação específica, reduzida em 0,1 ponto percentual, exceto em relação aos combustíveis sujeitos a regime específico.
VII – Imposto Seletivo
Foram regulamentados diversos pontos acerca do Imposto Seletivo, tais como:
- a) operações sujeitas ao referido imposto, o qual incidirá uma única vez sobre o bem ou serviço, sendo vedado qualquer tipo de aproveitamento de crédito do imposto com operações anteriores ou geração de créditos para operações posteriores;
- b) momento de ocorrência do fato gerador;
- c) hipóteses de não incidência; e
- d) base de cálculo.
VIII – Demais disposições
Os pontos aqui citados são um breve resumo do que consta na integra do ato, que conta com 544 artigos e 23 anexos.
A Lei Complementar também contempla disposições sobre regimes diferenciados, Simples Nacional, operações envolvendo serviços de transporte, operações imobiliárias, operações financeiras, produtores rurais, entre outras.
IX – Vetos
Foram vetados alguns dispositivos originalmente previstos, os quais ainda serão analisados pelo Congresso Nacional.
Dentre eles, destacamos os seguintes:
- a) incisos V e X do art. 26, que classificavam os fundos de investimento e fundos patrimoniais como não contribuintes de IBS e CBS;
- b) 4º do art. 183, que excluía as organizações gestoras de fundos patrimoniais instituídas pela Lei 13.800/2019 do regime especial aplicável aos serviços financeiros, promovendo, desta feita, a não incidência do IBS e CBS;
- c) 2º do art. 332, que tratava das regras acerca da impossibilidade de intimação com a utilização do sistema Domicílio Tributário Eletrônico (DTE); e
- d) art. 334, que dispunha sobre as datas em que seriam consideradas efetivadas as intimações por diversos meios (eletrônico, pessoal, postal e por edital).
Fonte: “Publicado originalmente no Checkpoint”.