Mais do que meros “pets”, os animais de estimação têm adquirido um papel de protagonismo dentro dos lares brasileiros. Considerados por muitos como amigos fiéis ou membros da família, a importância dada aos animais — não apenas aos domésticos — vem crescendo nos últimos anos, com implicações significativas nas normas jurídicas nacionais.
Muito embora o Código Civil ainda considere os animais como “coisas” ou “propriedade” dos donos, essa percepção vem sendo gradualmente modificada, o que tem ocasionado diversas alterações legislativas e o surgimento de novos impasses jurídicos, como questões de guarda compartilhada de pets, herança, entre outros.
Legislações pertinentes ao Direitos dos Animais:
A Constituição Federal assegura, no art. 225, § 1º, inciso VII, a proteção à fauna e à flora nacionais, proibindo práticas que danifiquem a função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam animais a maus-tratos.
Portanto, a Carta Magna brasileira garante a proteção da fauna, o que se alinha com o objetivo do caput desse artigo: assegurar o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, algo impossível sem a preservação da fauna e da flora.
Em decorrência dessa norma constitucional, foi criada a Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998), que estabelece sanções penais e administrativas para condutas lesivas ao meio ambiente.
Essa legislação tipifica, entre outros:
- Crimes contra a fauna;
- Crimes contra a flora;
- Crimes de poluição e outros crimes ambientais;
- Crimes contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural;
- Crimes contra a administração ambiental.
O art. 32 da Lei nº 9.605/1998 prevê o crime de praticar abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos, com pena de detenção de três meses a um ano, além de multa. A mesma pena é aplicada a quem realizar experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins científicos ou didáticos, quando houver outros meios disponíveis. A pena é aumentada de um sexto a um terço se resultar morte do animal.
Em 2002, com o advento do Código Civil brasileiro, manteve-se a classificação dos animais como bens semoventes, ou seja, bens móveis dotados de capacidade de locomoção própria.
Com a chamada Lei Sansão (Lei nº 14.064/2020), houve alteração no art. 32 para acrescentar causa de aumento de pena: nos casos de maus-tratos a cães e gatos, a punição passou a ser reclusão de dois a cinco anos, multa e proibição da guarda.
A Lei 15.150/2025 alterou o art. 32 da Lei de Crimes Ambientais incluindo também como crime a realização de tatuagens e a colocação de piercings em cães e gatos para fins estéticos
Mais recentemente, entrou em vigor a Lei nº 15.183/2025, que proíbe a utilização de animais em testes para a produção de cosméticos, perfumes e produtos de higiene pessoal no Brasil.
Apesar das mudanças recentes, ainda há muitos projetos em tramitação que poderão impactar essa matéria nos próximos anos.
Legislações em tramitação:
Um importante projeto em andamento é o PL nº 6.054/2019, conhecido como “Animais Não São Coisas”. Inicialmente apresentado como PL nº 6.799/2013, que propõe alterar o status jurídico dos animais, reconhecendo-os como sujeitos de direitos despersonificados, não mais sendo considerados “coisas”. O texto parte do reconhecimento dos animais como seres sencientes, ou seja, dotados de sensibilidade e capazes de sentir dor e prazer.
Outro projeto relevante é o PL nº 2.070/2023, que cria o Estatuto do Animal Doméstico, que estabelece direitos e garantias para os animais domésticos, define obrigações para os tutores e reafirma o princípio da dignidade animal.
Jurisprudência:
Enquanto algumas questões jurídicas envolvendo animais ainda carecem de legislação específica, os tribunais têm buscado soluções para certos impasses. No entanto, as decisões nem sempre são uniformes, o que dificulta a previsibilidade e a efetiva garantia dos direitos.
Entre as matérias já debatidas, destaca-se a guarda compartilhada de pets. Diversos tribunais têm reconhecido o vínculo afetivo entre tutores e animais e admitido guarda compartilhada, visitas e até pensão alimentícia para os animais, considerando-os, na prática, como seres sencientes.
A legislação pertinente aos animais vem passando por importantes modificações nos últimos anos, impulsionadas pela mudança na percepção social sobre os animais. É provável que, nos próximos anos, o Direito Animal sofra novas e significativas transformações.
Recomendação de leitura: Capacidade Processual dos Animais — A Judicialização do Direito Animal no Brasil, 2ª ed., Vicente de Paula Ataide Jr.